Dados do Ipea sobre violência e homicídios de mulheres negras e não negras na Bahia revelam diferença significativa
Por Brenda Santos, Bruna Carvalho e Victor Tapioca
Revisão: Antônio Netto
A violência é uma realidade muito presente na sociedade brasileira, principalmente na Bahia, um dos estados com maior número de homicídios no país, segundo o Atlas da Violência, relatório produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Mas quando nos referimos a violência contra a mulher a situação se alarma ainda mais.
De acordo com dados divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em 2018, mais de quatro mil mulheres foram assassinadas no Brasil, representando um total de 4,3 homicídios a cada 100 mil habitantes do sexo feminino.
Quando esse número total é dividido entre os estados, a Bahia possui um índice de 5,5 homicídios a cada 100 mil habitantes do sexo feminino, ficando em 9° lugar, mostrando que a situação das mulheres baianas é alarmante.
A mesma pesquisa, divulgada em 2020, mostra todas as crescentes e baixas das ocorrências entre 2008 e 2018 sobre a violência contra a mulher. Um dos dados apresentados mostra que nesse período a taxa de mortalidade de mulheres não negras sofreu uma queda de 3,2% para 2,8%, enquanto a taxa para mulheres negras cresceu de 4,6% para 5,2%. Praticamente o dobro.
Ainda analisando o Atlas da Violência, publicado pelo Ipea, em 2018, 68% das mulheres assassinadas no Brasil eram negras. Trazendo esse percentual para o âmbito estadual, 89,3% das mulheres assassinadas na Bahia também são negras.
Fernanda Paradella, Psicóloga da Unidade de Acolhimento Institucional Casa das Pérolas e especialista na Educação em Gênero e Direitos Humanos pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), trabalha diariamente na assistência às mulheres vítimas de violência.
Para a profissional, “algumas delegacias especializadas não tratam do assunto como deveriam, às vezes com profissionais que não são capacitados e acaba surgindo uma culpabilização da mulher”.
A maioria das agressões contra a mulher acontecem dentro de suas próprias residências (42%), geralmente tendo os companheiros como agressores (76,4%). Nesses casos, há uma complicação maior para que a queixa aconteça, pois 52% dessas mulheres não denunciam o agressor, segundo o levantamento do Datafolha, feito em fevereiro de 2019.
Além disso, a falta de acesso à informação acerca dos canais de denúncia e despreparo por parte das delegacias especializadas são fatores que agravam ainda mais essa situação, explica a psicóloga.
Paradella afirma que deve haver uma melhoria no acesso aos canais de denúncia e rede de proteção, visto que muitas mulheres nem sequer sabem onde buscar ajuda.
“Denúncias acabam não se efetivando por falta de atenção devida, onde muitas vezes é uma situação de risco iminente de morte”, afirma a psicóloga sobre a falta de preparo dos profissionais das delegacias.
“O acesso à denúncia torna-se complicado para muitas mulheres, principalmente para as mulheres negras socialmente desamparadas que, diversas vezes, buscam ajuda, mas terminam recorrendo à maneira errada”, alega Paradella.
Por conta disso, o trabalho da psicóloga é tão importante. A profissional revela que grande parte das mulheres atendidas na instituição são negras e que na maioria das vezes precisam voltar para o ambiente hostil em que vivem.
Para Paradella, um dos maiores desafios é fazer essa mulher entender que foi vítima de violência, pois muitas não conseguem identificar outros tipos de agressão além da física.
“É importante trabalhar a autonomia dessa mulher, não só financeira, mas também fazer com que ela recupere a sua autoestima, que nesses casos é muito abalada, podendo desenvolver traumas, transtornos de estresse pós-traumático e ansiedade”, explica a psicóloga.
Aliado às questões anteriormente citadas, o machismo e racismo na sociedade baiana são determinantes para que negras sejam cada vez mais vítimas de diversos tipos de violência, diz a profissional.
Fernanda também acrescenta que trazer as discussões de gênero e introduzi-las no currículo escolar como disciplina transversal, que já é prevista nas Leis e Diretrizes e Bases da Educação, desde a década de 80, é de suma importância para mudar esta situação:
“Eu costumo dizer que o fato das leis existirem, das delegacias especializadas, da rede de proteção e das casas de acolhimento, tudo isso é um avanço. O fato de estarmos discutindo sobre isso é um avanço muito grande”, relata.
“Mas acredito que a cultura é sempre a questão mais difícil a ser rompida, alguns avanços aconteceram e isso tem a ver com essas discussões, mas elas têm que passar das paredes acadêmicas, do ambiente científico e atingir essa sociedade como um todo, que até hoje é mergulhada nessa questão do machismo de uma maneira absurda”, conclui a psicóloga.
No âmbito jurídico
A advogada Talita Santos explica que a mulher que mais sofre violência é a mulher negra. “As mulheres negras ainda são maioria no subemprego, escolaridade baixa, fora do mercado de trabalho e, sobretudo, no mapa da violência contra a mulher”, explica a advogada.
Além do fato de que grande parcela da população feminina baiana é negra, ainda existe a triste realidade que a maior parte dessas mulheres são socialmente desamparadas, como relata o estudo “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça”, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), publicado em 2018.
A advogada ressalta a necessidade da participação de todos nessa causa: “Qualquer pessoa poderá denunciar um caso de violência contra a mulher, com o intuito de repelir e cessar as agressões”, afirma Santos.
“Entretanto, a pandemia veio para dificultar ainda mais a vida das mulheres, já que é muito mais difícil conseguir testemunhas para essa situação, além do isolamento proporcionar a essa vítima um convívio maior com seu agressor”, completa a profissional.
Canais de denúncia
Confira meios de denúncia na Bahia:
· Centro de Referência de Atendimento à Mulher (Cram);
· Núcleo de Defesa da Mulher da Defensoria Pública (Nudem);
· Grupo de Atuação Especial em Defesa da Mulher (Gedem);
· Delegacias de Atendimento à Mulher (Deam).
O Governo Estadual da Bahia publicou em seu site oficial inúmeros canais e formas de denunciar casos de violência contra a mulher. Basta acesse o link para mais informações.
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Muito importante essas informações, Belo trabalho! Necessário ações urgentes para reduzir esses números. Parabéns mais uma vez pela matéria, muito pertinente e esclarecedora.
Matéria bem feita, com conteúdo bem elabora e rica em detalhamento e informações. Parabéns aos jornalistas
Informações úteis e que deveriam ser expostas para toda a população como alerta e conscientização. Parabéns pelo trabalho!