Palco do Afropunk Foto: Divulgação
Festival de música negra, que comemora 20 anos de existência, reúne um público diverso e exalta suas diferenças
Por Maria Fernanda Cardoso
Revisão: Juliana Brito
Nos dias 9 e 10 de novembro acontecerá a quarta edição do festival Afropunk, no Parque de Exposições Agropecuárias de Salvador. O festival terá a presença de diversos artistas baianos, entre eles: Silvanno Salles, Léo Santana, Ilê Aiyê e Virgínia Rodrigues, que se juntarão a músicos brasileiros e internacionais, como Erykah Badu e Lianne la Havas.
O festival
Nascido para enegrecer os espaços do punk e do rock, o Afropunk vai além de um festival de música negra, é um movimento. Em 2005, surge a partir da produção do documentário Afro-Punk do cineasta Matthew Morgan, que destacava as pessoas negras na cena do movimento Punk nos Estados Unidos. Morgan, que também é executivo da indústria musical, acabou transformando sua ideia em festival que une negritude, moda e música.
No Brasil, a sua primeira edição aconteceu em 2019 em São Paulo, no final de semana da Consciência Negra. Porém, é em Salvador, a cidade mais negra fora do continente africano, que o festival cria raízes. Esse é o seu quarto ano na cidade e a sua força segue representando como a cultura é uma forma de resistência da população negra.
Movimentos culturais
Segundo o censo do IBGE de 2022, Salvador tem a sua população composta por 79,9% de pessoas pretas e pardas. Como um reflexo, temos movimentos culturais e históricos que mostram a força dessa população. Um exemplo são os Blocos Afros e os Afoxés, que unem história, música, moda e religiosidade em um espaço que durante anos era a única forma de pessoas negras participarem dos circuitos oficiais do Carnaval de Salvador.
O Ilê Aiyê, os filhos de Gandhi, o Cortejo Afro, entre outros blocos que fazem história na cidade, representam diversos aspectos da cultura negra. Esses símbolos mostram como a cultura é uma forma legítima de combater preconceitos e discriminações.
Hoje, temos novos movimentos culturais que exaltam a representatividade negra. A Batekoo, criada em 2014, é um exemplo de movimento periférico que foca na comunidade negra e LGBTQIA+, ocupando a cidade e renovando sua representação.
Nesse contexto, a bailarina Jéssica Santana, conhecida como “a menina do afrobeat”, compartilha sua experiência no Afropunk, destacando como o festival se conecta aos movimentos culturais de Salvador: “O que os blocos afros, a Batekoo, outras festas e outras celebrações culturais e existentes em Salvador fazem, é justamente não deixar que essa cultura, essa celebração, morra.”
Protagonismo e Liberdade
Além da presença nos palcos, o festival conta com pessoas negras em todas as áreas, desde a equipe até trabalhadores da indústria alimentícia e da beleza, tornando-se um símbolo do protagonismo da negritude.
“Faz parte da minha história, estar no festival é estar em um lugar de protagonismo”, afirma Jéssica.
Para ela, o afropunk é um movimento criado por e para pessoas pretas, evidenciando a importância da negritude e sua cultura como protagonistas nesses espaços muitas vezes inacessíveis. O festival é mais que um movimento, é um encontro ancestral, é uma experiência.
Jéssica também enfatiza que a estética negra é uma parte fundamental da identidade: “Eu sou uma pessoa diferente, eu me considero diferente, eu sou uma mulher negra que usa o cabelo loiro, 613, um marley hair, um cabelo exagerado, como dizem, que é um cabelo que chama atenção […] Mas é um cabelo que eu consigo ver e me entender.”
O ambiente do festival, segundo ela, é um espaço livre de julgamentos, onde todos têm a liberdade de se expressar de maneira autêntica, para além do racismo: “É de extrema importância ter um lugar que eu consiga me vestir da forma que eu quero, me expressar da forma que eu quero, que [toque] as músicas que ouça, que eu dance, que eu me expresse que eu realmente seja eu, [que] não seja um lugar de preconceito”.
“As pessoas que vão para o festival se empenham para entregar algo bacana, um look fashion e se sentir à vontade”, ressalta João Viana, fotógrafo soteropolitano que participou do Afropunk na edição de 2022 e 2023.
Edição de 2024
No mês da consciência negra, a edição de 2024 tem a expectativa de ter a presença de um público ainda maior, já que essa edição faz parte da comemoração dos 20 anos de existência do festival. A empresa IDW é a responsável pelo festival na Bahia e um dos seus objetivos é promover o empreendedorismo negro para dentro do festival. Em 2023, o Afropunk movimentou R$ 19 milhões em Salvador.
Além de sua significativa contribuição econômica e da atenção que traz à cidade, o festival celebra a cultura negra e comemora as suas diferenças, fazendo com que o público se sinta livre e contribuindo para a resistência do povo preto em Salvador por meio de um aspecto fundador na cidade, a cultura.