Estruturas sociais, capitalismo, religião e até referências com o período de pandemia do Covid-19 são interpretadas pelos professores Amanda Aouad e Antônio Netto, da Unifacs.
Por Marco Dias*
A obra cinematográfica espanhola “O Poço” foi o tema da live realizada pela Unifacs nesta segunda-feira (06) e promovida pelos professores da instituição, Amanda Aouad e Antônio Netto.
Através de uma análise estética e comunicacional, os professores debatem com as mais de quarenta pessoas online as diversas teorias e proposições que o longa da Netflix traz para reflexão.
Filmes “Cult”
Para Amanda Aouad, os filmes europeus possuem uma linguagem diferente dos filmes hollywoodianos e a Netflix possibilita o acesso dessas obras para um público variado. “O streaming tem mudado a lógica do cinema, do público ter mais acesso à esses tipos de filmes ditos cults”, afirma a professora.
O professor Antônio Netto reforça que os “filmes cults deixam pontas soltas propositais, para que o público de aproprie da narrativa e faça suas interpretações”.
“É um modelo diferente do formato hollywoodiano, que a ‘papinha’ da narrativa vem toda pronta, apesar de que esses filmes comerciais já estão se apropriando da técnica”, declara o professor, citando o conceito do autor Henry Jenkins sobre a dinâmica do consumo de obras na sociedade moderna.
Estruturas Sociais
Antônio Netto destaca uma citação da obra, onde o personagem Trimagasi (interpretado por Zorion Eguileor) explica para o protagonista, Goreng (Ivan Massagué), que existem três tipos de pessoas: “os de cima, os de baixo e os que caem”. “Quanto mais os personagens vão descendo, mais sombrio fica”, afirma.
Aouad destaca a relação do filme com a ascensão e decadência social, refletindo sobre as posições que os personagens ocupam no poço, a lógica da construção vertical e como isso varia em um curto período de tempo no filme.
“Essa é uma analogia com o nosso sistema social, dos mais ricos, que consome tudo, e os mais pobre, que ficam sem acesso aos recursos. Há também uma interpretação política, uma crítica ao capitalismo e até uma referencia ao comunismo, ou socialismo, com as luzes vermelhas na subida da plataforma”, explica Aouad.
Coronavírus
A Professora Aouad afirma que o cinema sempre encontra uma alegoria para representar a vida e que “O Poço” faz isso de uma maneira que dialoga com o momento que vivemos da pandemia mundial do coronavírus.
“Com o coronavírus, a ida aos mercados, estocar de comida, a compra de álcool em gel, as pessoas viram animais, perdem a racionalidade, a humanidade. É a lógico do preciso garantir o meu primeiro”, complementa Netto, comparando a realidade atual com a narrativa do filme.
Interpretações religiosas
Para Antônio Netto, o filme possui uma interpretação religiosa evidente em diversos momentos, como no número de andares do poço: “São 333 andares, duas pessoas por andar, ou seja, totalizam 666, conhecido por ser o número da besta”, explica.
“Seria a dicotomia do céu, que está no topo e fornece todos os recursos necessários, e os últimos andares, que representa o inferno, causado pelas próprias pessoas, quanto mais fundo, mais sem recursos, mais desespero, mais sem possibilidade de vida”, completa Aouad.
Outro exemplo de interpretação religiosa citado pelos professores é de uma “estrutura da Sagrada Família”, conforme relata Netto:
“A personagem Miharu é uma mãe procurando o filho, uma mulher que não poderia estar grávida ali, que ninguém acredita na existência dessa criança. Depois, Goreng, que, sem perceber o motivo, cria uma ligação com essa mulher, quase fraternal”, lista os personagens, referenciando-os como Maria e José.
“Por fim, a criança encontrada no fundo do posso, que nos desperta o sentido de divindade, de renascimento, afinal como ela poderia estar viva e com aparência saudável ali?”, questiona o professor, completando essa relação da criança com o menino Jesus.
Essa análise, segundo os professores, reforça a ideia proposta no filme de que a “criança é a mensagem”, ao invés de representações como a panacota ou o próprio Goreng.
Unifacs Lives:
Durante o isolamento social, a Unifacs está realizando uma série de transmissões ao vivo, chamada de Unifacs Lives, com professores e especialistas, nos diversos segmentos e áreas, para fornecer conteúdos educacionais e de entretenimento ao corpo acadêmico.
Sobre os professores da live: “Filme “O Poço”: Análise Estética e Comunicacional
Profa. Amanda Aouad é crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia.
É ainda professora dos cursos de Jornalismo, Relações Públicas e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Prof. Antônio Netto, atua na Universidade Salvador (Unifacs) nos Cursos de Jornalismo, Comunicação e Marketing, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas. Especialista em Ciências da Comunicação (UNL-Portugal). Foi colunista de tecnologia e meios digitais na Rádio CBN Salvador.
Tem ampla experiência internacional no mercado de comunicação, tanto social quanto empresarial, atuando em importantes órgãos da área em Portugal (SIC) e Alemanha (Deutsche Welle).
*Sob supervisão de Antonio Netto, Professor de Jornalismo da UNIFACS e Coordenador da AVERA.