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O Ilê Aiyê, primeiro bloco afro-brasileiro, celebra seus 50 anos de resistência e orgulho negro
Por Catarina Gramosa
Revisão: Juliana Brito
No primeiro dia do mês de novembro, o bloco afro Ilê Aiyê completou 50 anos de existência, sendo um grande expoente da cultura negra baiana. Em um país marcado pela desigualdade racial e o apagamento da cultura negra, o bloco se sobressai como um símbolo de vigor e de admiração da identidade afro-brasileira.
Origem e desafios
Criado em 1974, o primeiro bloco afro do Brasil carrega em sua carreira não apenas a comemoração da cultura negra, mas também a luta pela igualdade e reconhecimento. A frente deste movimento, se ressaltam duas figuras: Antônio Carlos dos Santos (Vovô), fundador e presidente do bloco Ilê, e Mãe Hilda de Jitolú, matriarca que, com sua visão e dedicação, transformou o terreiro em um espaço de educação e formação para novas gerações.
O Ilê nasceu no dia 01 de novembro de 1974, quando Vovô e os moradores da ladeira do Curuzu trouxeram uma proposta de um bloco ser totalmente voltado para cultura, para dança e para música afro. “Este é o primeiro bloco afro do Brasil, um bloco dirigido por pessoas negras e que veio através do Carnaval com a iniciativa de combater o racismo”, afirma Vovô.
Ele relembra os desafios de como foi surgir o Ilê durante um período de intensas tensões sociais e raciais no Brasil. A criação do bloco não foi nada fácil, desde a preparação e a coragem para poder encarar o preconceito e os desafios colocados pela sociedade da época. “Foi meio assustador, empolgante, porque muitos pais recusaram a deixar os filhos participarem, com medo das possíveis consequências devido ao sistema político da época”, conta.
Desde o ínicio, o Ilê não se limitou apenas ao Carnaval. Ele se tornou um movimento que vai muito mais além da festa, representando a identidade e a resistência da cultura afro na Bahia e no Brasil.
O bloco leva para as ruas de Salvador um desfile que não é apenas uma comemoração. Também é uma manifestação que traz a tona questões sociais que incentivam reflexões sobre a história, beleza e força do povo negro. São roupas vibrantes, músicas impactantes e temas que reforçam a conexão com a ancestralidade africana, inspirando as novas gerações.
Celebração dos 50 anos
Ao completar 50 anos, o Ilê Aiyê celebra um legado transformador. Para Vovô, o maior triunfo do bloco é o resgate da autoestima e da identidade. “Conseguimos fazer com que as pessoas assumissem sua negritude, sentissem orgulho de quem são. Esse é o maior legado do Ilê”, destaca.
Mas para falar do Ilê Aiyê, é necessário falar de quem foi sua base: Mãe Hilda de Jitolú matriarca e maior exemplo do grupo. Em 1988, no terreiro do Axé de Tolu, ela transformou seu espaço sagrado em um centro de educação e formação para a comunidade, fundando assim a escola Mãe Hilda.
Visionária, a matriarca oferecia um ambiente onde as crianças não apenas aprendiam os conteúdos escolares, mas também eram ensinadas a valorizar sua história, suas raízes e a ter orgulho de sua identidade afro-brasileira.
Como qualquer escola quando abre, Mãe Hilda também enfrentou desafios imensos. Sustentar uma escola em um ambiente privado, que também era a casa de sua família e o terreiro, exigia muita determinação e força.“Não era fácil pagar professores, manter o espaço. Era basicamente tudo trabalho voluntário, mas a vontade de fazer superava qualquer obstáculo. Tudo isso era uma missão ancestral”, reforça Valéria, neta de Mãe Hilda.
Além da instituição, Mãe Hilda inspirou muitos outros projetos educacionais do Ilê, como a Band’Erê, escola de música e percussão, e o projeto Ascensão Pedagógica, que oferece formação para professores da rede pública. Esses esforços não apenas perpetuavam sua visão, mas também fortaleceram a educação afro-brasileira décadas antes da Lei 10.639, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas.
Valéria enfatiza a mensagem que Mãe Hilda deixaria. “Olhar para trás para dar passos mais largos, para voar mais alto”, frisa.