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Evento online da Igreja simboliza a dignidade de cada vida humana e conseguiu arrecadações para comunidades vulneráveis, incluindo LGBTQIA+
Por Jéssica Nobre
Revisão: Fernanda Abreu
Solidariedade, essa é a palavra que resume o Chá de Maio, ação solidária promovida pela Igreja Batista Nazareth (IBN) em Salvador, no último dia 7 deste mês, realizada em ambiente online, visando arrecadar dinheiro em prol de pessoas necessitadas, entre elas, membros da comunidade LGBTQIA+ que perderam seus empregos durante a pandemia.
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O evento cultural acontece anualmente, mas em razão da questão da fome ter aumentado no Brasil após a Covid-19 e da demanda de grupos que já eram apoiados pela Igreja, como o Grupo de Mulheres do Alto das Pombas (GRUMAP) e o Coletivo de Artistas Drag Queens, a ideia de ser apenas um evento cultural se expandiu.
“O objetivo foi atender esses grupos mais vulneráveis, porque nós sabemos que ainda existe muito preconceito na comunidade e nas igrejas, em particular, continua a ser muito grande”, comenta o pastor da IBN, Joel Zafferino.
A mobilização para arrecadação realizada pela Igreja envolveu artistas da casa como convidados especiais e pessoas da mídia, inclusive as Drag Queens Desirée Beck e Eva Perón, que já foram à comunidade.
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“A ação representa a concretização do meu ideal de comunidade de fé, alinhada com os valores que eu acredito e que estão em consonância com a mensagem de Cristo, que é de amar ao próximo como a mim mesmo”, aduz Ton Shubber, gay cis, coordenador do evento e integrante da Igreja Batista Nazareth.
A Igreja distribuiu 25 cestas básicas a artistas transformistas e drag queens, profissionais da noite e entretenimento, mulheres trans e travestis que trabalham com prostituição e que foram os primeiros a interromperem suas atividades e os últimos que poderão retomá-las após a pandemia.
A pandemia aproximou ainda mais a Igreja às pautas LGBTQIA+
A pandemia trouxe alguns desafios para sociedade, entre eles, a imersão ao online. E não foi diferente com a Igreja Batista Nazareth. A Igreja migrou para as redes sociais e, principalmente no Instagram, passou a ter contato com diversos grupos que lutam por direitos LGBTQIA+.
“A igreja sempre teve a pauta de defesa de direitos. O online apenas estreitou os laços que tínhamos. A própria comunidade LGBTQIA+ foi reafirmando suas pautas por direitos, nós apenas acolhemos essa luta, mas já temos pessoas dessa comunidade na igreja há tempos, casais que participam como qualquer membro”, afirma Zafferino.
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Para as pessoas que fazem parte da comunidade LGBTQIA+ e que são membros da igreja, a ação representa um avanço no campo religioso tradicional para questões que muitas vezes eram debatidas de formas errôneas pela sociedade.
“A ação representa a certeza de que chegamos em um caminho muito frutífero. Infelizmente por conta da pandemia, mas principalmente no nível de solidariedade que a Igreja Batista conseguiu alcançar. Nível muito importante, porque muitas pessoas que passam por ali precisam ser afirmadas através da sua identidade sexual”, comenta Karine Damasceno, mulher negra e lésbica e integrante da Igreja Batista Nazareth.
A IBN não nega o acolhimento às pessoas LGBTQIA+ e isso aproxima ainda mais a reafirmação da fé e o empoderamento dessa comunidade.
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“Eu e meu companheiro nos aproximamos da Igreja durante a pandemia. A identificação com Nazareth foi se estreitando durante os cultos online, culminando em nossa transição definitiva. Ter um território de fé que nos pertence e sempre nos foi negado. Sentimos um acolhimento genuíno das pessoas da igreja”, afirma Shubber.
O acolhimento dos membros da Igreja Batista
No ano em que se é comemorado 52 anos do Dia Internacional do Orgulho Gay, dia 28 de junho, ver igrejas que se posicionam na defesa da diversidade, que integram pessoas com o objetivo de acolher o próximo com amor, independente da orientação sexual, é um avanço importante.
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“A igreja é um lugar para todos. As portas devem estar abertas, assim como os nossos abraços. Acredito que a Palavra de Deus que é nossa rocha e nossa bússola, funciona também como um manual de vida. Vejo essa ação como um papel da igreja, que é não fazer acepção de pessoas”, comenta Daiane Miranda, advogada e membro da Igreja Batista em Irecê, na Bahia, desde criança.
Segundo o pastor Zafferino, a aproximação da Igreja com a comunidade LGBTQIA+ demonstra que a instituição está amadurecendo e que a convivência tem sido um aprendizado enriquecedor, afinal, a Nazareth sempre teve como finalidade a defesa dos direitos de todo ser humano.
“Ver a Igreja Nazareth como lugar de resistência junto às pessoas LGBTQIA+ e lutando contra as correntes, é a demonstração de esperança e fé. Me sinto feliz e realizada de estar acompanhando esse processo dentro da minha igreja”, aduz Damasceno.
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Para a presidente da IBN, Nádia Khouri, de um modo geral, os membros da Igreja aceitam bem a presença de todos, já que a instituição sempre foi inclusiva e já nasceu defendendo o diferente e o marginalizado.
“Vemos com muita alegria e orgulho essa oportunidade. Sempre aceitamos pessoas LGBTQIA+, tanto como membros da igreja, como palestrantes dos nossos cultos”, comenta Khouri.
Do futuro apoio da Igreja à comunidade LGBTQIA+
Em razão da grande aproximação que as redes sociais proporcionaram aos novos membros da igreja, Zafferino, junto com alguns membros da Nazareth, já pensa em criar novas diretrizes de inclusão para a comunidade LGBTQIA+.
“Diante dos debates sobre o tema e como consequência da fala de um dos membros, decidimos criar, ainda que provisório, o Núcleo LGBTQAI+. A ação não se resume a apenas distribuição de cestas a essa comunidade, mas de formação, de apoio das lutas e todas as ações que são importantes. Então, o apoio pretende-se continuar e fortalecer”, afirma o pastor.
A luta das pessoas LGBTQIA+ é pelo direito ao amor. Persistir pelo que são em um mundo que tenta fazê-los desistir todos os dias é um ato de coragem. E o papel da igreja mostra-se fundamental para o desenvolvimento pessoal e espiritual dessa comunidade ainda hostilizada, invisibilizada, cheia de estigmas, mas também muito fragilizada.
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Produção e coordenação de pautas: Márcio Walter Machado