Caminhoneiro Jean Francisco, ao lado da esposa Nádia de Oliveira – Foto: Emily Nery
Estradas recuperadas beneficiam transportadores e promovem sustentabilidade no agronegócio da Bahia
Por: Emily Nery
É percorrendo as estradas de Norte a Sul do Brasil que o caminhoneiro Jean Francisco, de Santa Catarina, leva o sustento para casa. E para executar seu trabalho sem obstáculos, precisa que as estradas estejam em bom estado. “Se a rodovia não está bem conservada, além de impactar no custo com o pneu, que pode vir a furar, impacta também no consumo do diesel. Tudo isso reflete na viagem, tanto em hora, quanto em custo de manutenção”, declara.
O Brasil, país de dimensões continentais, tem o modal rodoviário como o principal meio de transporte de cargas. Segundo a pesquisa dos Custos Logísticos no Brasil, divulgada pela Fundação Dom Cabral, cerca de 75% das cargas são escoadas por rodovias, sublinhando o importante papel dos caminhoneiros no ecossistema da agricultura brasileira. Aliás, o agronegócio foi responsável por expressivos 23% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, na média entre 1995 e 2021, de acordo com o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea).
Dados que reforçam a relevância do setor para a economia nacional e dos transportadores, que garantem que os produtos agrícolas cheguem aos centros urbanos e portos para exportação, conectando o campo à milhões de brasileiros e a mercados internacionais.
Estes números são também motivo de orgulho para o caminhoneiro Regis Eckhardt, do Rio Grande do Sul, que decidiu morar em Luís Eduardo Magalhães devido às oportunidades de emprego. Regis logo cedo constatou a importância do ofício herdado de pai para filho: “Levamos o progresso ao país, mesmo com as dificuldades que encontramos. A responsabilidade do transportador em levar essa grandeza é um mérito”.
Eckhardt faz parte dos milhares de caminhoneiros que têm a ‘capital’ do Matopiba – fronteira agrícola que reúne áreas do Maranhão, do Tocantins, do Piauí e, por fim, da Bahia – como ponto de partida para o escoamento da safra produzida. Durante todos os anos, caminhões percorrem o caminho das fazendas e armazéns até o porto pelas rodovias do cerrado baiano.
Mas a realidade de tráfego no maior pólo agrícola do Nordeste brasileiro nem sempre foi tão favorável. Sem revestimento asfáltico, as vias secundárias, que conectam comunidades remotas e áreas agrícolas do Oeste baiano às principais rodovias estaduais e federais, apresentavam más condições. Principalmente em períodos chuvosos, essas vias geravam inúmeros riscos, como acidentes, avarias e caminhões atolados, causando prejuízos com atrasos nas entregas e aumento nas despesas do frete.
A partir desse desafio, nasceu o Projeto Patrulha Mecanizada, desenvolvido pela Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa), voltado para a compra de máquinas, insumos e veículos de apoio para facilitar o escoamento e transporte da produção agrícola e para preservação dos recursos naturais das lavouras do algodão.
Com dez anos de atuação, o projeto já asfaltou cerca de 230 quilômetros de vias e recuperou 5.950 quilômetros de estrada na Bahia. A iniciativa é resultado da soma de esforços entre Abapa, produtores rurais e órgãos públicos e privados.
“Recebo vários vídeos dos carreteiros passando na estrada à noite falando: ‘Olha aí gente, tá iluminada! Você lembra? Aquele local que eu fiquei atolado por dois dias’. É muito gratificante ver que impacta diretamente na vida das pessoas”, relata Daniella Dias, gerente do Patrulha Mecanizada.
Segundo dados da Abapa, somente em 2022, foram executadas obras de recuperação e manutenção em 31 estradas, com 925 quilômetros de extensão.
Jean Francisco divide a boleia de seu caminhão com a esposa Nádia de Oliveira e já estão há 30 dias fora de casa. Apesar de trabalhar durante todo o ano percorrendo o país, essa é a primeira vez que o motorista transporta uma carga de algodão pelas estradas do cerrado baiano e elogia a qualidade das vias: “Voltaria a fazer justamente pela qualidade que está a rodovia”.
O projeto é financiado pelo Instituto Brasileiro de Algodão (IBA) e conta com a parceria dos produtores rurais do Oeste baiano; da Associação dos Agricultores e Irrigantes da Bahia (AIBA), através do Programa para o Desenvolvimento da Agropecuária (Prodeagro); do Fundo para o Desenvolvimento do Agronegócio do Algodão (Fundeagro) e das prefeituras municipais.
A força-tarefa, iniciada em 2013, transmite alívio a quem utiliza as vias devidamente pavimentadas e recuperadas. Há 11 anos, Henrique Moreira é gestor da Zanotto Cotton, indústria de beneficiamento e armazenamento de algodão, e relembra que antes da Patrulha Mecanizada, a empresa tinha contratempos, como a perda de produtos da carga, causados pelas más condições das estradas vicinais.
“O próprio transporte, quando trafega e não tem muito buraco, acaba beneficiado, porque a carga não tem oscilação, caindo menos [produção] na estrada. Antigamente nós tínhamos problemas de carga cair, despencar de cima do caminhão. Mas depois da recuperação feita pela Patrulha Mecanizada isso foi sanado, corrigindo os defeitos da estrada”, relata Moreira.
Da logística à sustentabilidade
Presidente da Abapa, Luiz Carlos Bergamaschi, destaca que a Patrulha Mecanizada é uma iniciativa que vai muito além de uma solução para o gargalo logístico enfrentado pelos agricultores no escoamento da safra e dos insumos agrícolas. Para o Presidente, o projeto beneficia o patrimônio público, gerando segurança e conforto aos viajantes, o que reflete em toda mobilidade nacional, com a facilidade de acesso.
“Pegamos uma dificuldade, encontramos uma solução. Aquilo beneficia a quem? Ao produtor? Claro, podendo transportar a qualquer época do ano, mas também a sociedade. Qualquer um para na cidade, qualquer um pode usar a estrada. É para todos!”, afirma Bergamaschi.
O Programa está alicerçado no triplo pilar do conceito de sustentabilidade: ambiental, social e econômico. A ação agrega intervenções específicas de conservação ambiental, contribuindo para o direcionamento da água das chuvas e promovendo seu aproveitamento. A medida também interrompe o processo de assoreamento dos rios, colaborando para o abastecimento do lençol freático, através da infiltração da água da chuva no solo.
Para isso, são realizadas obras como barreiras de contenção [lombadas], desvios laterais [saídas d’água, sarjetas, valetas e desaguadores], além de bacias ou caixas de captação, bueiros de concreto e barraginhas para captação de água, construídas em pontos estratégicos ao longo das vias.
De 2013 a 2020, foram contabilizados dez mil unidades entre bacias de captação e dez mil desvios laterais; e, no último biênio, mais seis mil unidades, entre bacias de captação e desvios laterais.
Além disso, através de parcerias com organizações ambientais e governamentais, o projeto tem implementado ações para preservar e restaurar as nascentes na região, promovendo práticas agrícolas mais conscientes e sustentáveis.