Descaso, contratos amadores, falta de investimento e apoio, fazem parte do cotidiano das jogadoras de futebol
Por: Alexandre Falcão, Isla Carvalho e Nalanda Rocha
Revisão: Antonio Netto
O futebol feminino, no contexto Brasil, vem sendo um desafio para as jogadoras quando o assunto é a profissionalização dos contratos, mesmo com iniciativas da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).
No ano de 2019, a CBF criou uma regra que obriga a manutenção da modalidade feminina em clubes que participam da série A do Brasileirão masculino, através do Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut).
Porém, nomes conhecidos do futebol como Esporte Clube Vitória, Atlético-PR e Goiás, ainda mantêm suas atletas associadas ao clube por contratos amadores.
Contratos esses que duram entre seis meses a um ano e não garantem uma longa permanência no clube. O que por si, dificulta o trabalho, a sincronia da equipe e impede o desenvolvimento para as próximas temporadas.
Antes disso, a modalidade feminina foi considerada crime no Brasil durante 38 anos. Conforme o Decreto-lei n.º 3.199, criado em 14 de abril de 1941, a prática era incompatível com as condições da natureza feminina. Sendo assim, prejudicial à maternidade. Somente em 1979, o decreto foi revogado.
Investimento no Futebol Feminino
O atual campeão mundial de futebol feminino, Estados Unidos da América (EUA), já tem a modalidade como prioridade, com projetos de formação que se iniciam aos cinco anos de idade e influenciam diretamente em jogadoras com maior conhecimento técnico e condicionamento físico, assim tornando-se mais preparadas para o mercado.
Diferente disso, o Brasil caminha com maior dificuldade. Em entrevista, Tamires Fukutani, editora-chefe do Globo Esporte Online (GE-BA), comenta que o problema vem desde a formação de base até a falta de um trabalho adaptado para a modalidade feminina.
“Várias áreas da educação física trabalham de acordo com o calendário menstrual, dependendo da época do mês, um tipo de treino”, conta Fukutani.
As finanças revelam a dificuldade dos clubes em lidar com o assunto. A falta de receita e competições atrativas financeiramente, é fator de destaque. De acordo com o levantamento feito no portal Extra Globo, em 2019, o orçamento dos clubes para a modalidade feminina é menos de 1%.
Como justificativa da falta de investimento, Lula Tavares, radialista e amante do futebol feminino, afirma que “por a CBF ainda não ter deixado claro que o futebol feminino é um produto forte, consolidado, evita a criação de um ambiente seguro para investimentos. Sendo assim, os clubes não têm a certeza que o produto vale investir”.
Dificuldades
Os desafios do futebol feminino começam com o público e refletem nos setores de comunicação, como um assunto pouco noticiável.
“Quando a gente publica algo não tem esse mesmo retorno [que o futebol masculino]. Ainda não move paixões de torcedores”, relata Fukutani.
A editora acredita na mídia como um meio de influência para o interesse no futebol feminino. A iniciativa de veículos é um movimento na tentativa de conquistar o público e assim aumentar cada vez mais a demanda para a cobertura da modalidade.
“Se isso for um movimento coletivo as pessoas têm que aceitar’’, conta a editora do GE Bahia. No entanto, apesar da iniciativa da mídia, a dificuldade vem enraizada socialmente.
Como no caso de Tássia Moraes, de 22 anos, torcedora e amante do futebol, que aos 15 recebeu uma proposta para jogar nos EUA. Mas a questão social em volta do futebol feminino e a falta de expectativa futura na profissão fez com que ela recusasse a proposta.
Já Isabela Ferreira, de 29 anos, começou a jogar aos 12 e ao longo da sua trajetória acompanhou suas colegas de time desistindo do esporte.
“Tive que jogar com os meninos do time, não pude participar dos campeonatos, nem mesmo amistosos, eu usava a camisa do time somente para treino e isso foi me desmotivando, até que aos 17 anos desisti de jogar bola”, desabafa Ferreira.
Entretanto, aos 23 anos, a jogadora foi convocada para a seletiva do time feminino do Ponte Preta-BA. E mesmo com a idade considerada avançada para a prática futebol, foi contratada. Atualmente é sub-capitã e lateral direita do time.
Mudanças no mercado
A atual gestão do Esporte Clube Bahia age diferente dos problemas citados em relação aos outros clubes, sendo pioneira quando se fala de futebol feminino. Desde o início de 2019 o clube vem criando iniciativas para profissionalização de suas jogadoras.
Através de carta oficial, publicada em site, o clube anunciou a profissionalização dos contratos das jogadoras do time principal feminino no dia 8 de março de 2021, dia internacional da mulher.
“Agora, nossas atletas passarão a ter direito a férias remuneradas, FGTS e 13° salário, além das proteções legais específicas da lei geral do desporto”, divulga o time do Bahia em carta.
Para Tavares, o futebol feminino “pode esperar um ambiente bastante positivo. Quanto maior a visibilidade, maior esse mercado se tornará. Sem dúvidas, o futebol feminino respira um crescimento sólido, em progressão geométrica”.
“A Liga dos Campeões feminina na Europa é um ótimo exemplo, uma maravilhosa realidade. No último sábado ,16 de maio, o Barcelona venceu o Chelsea e conquistou o título. Mais patrocinadores surgirão e com eles chances enormes e reais dos clubes investirem em infraestrutura”, conclui o radialista.
Em consentimento, porém pouco esperançosa, Fukutani afirma: “Vai demorar um pouco. Eu acho que nós já estamos muito melhores que antes, sem dúvida alguma. O Profut foi um item essencial para isso. Mas ainda falta muito para chegarmos no ideal”.
Entrevista na íntegra com Tamires Fukutani
[Áudio da entrevista – Entrevista com Tamires Fukutani]
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Um ótimo tema, ficou incrível!
Matéria excelente! muito bem construída!