Hoje, 24 de abril, é o Dia Nacional da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Entenda a significância da data além das dificuldades, iniciativas e dos avanços para a difusão desse meio de comunicação no entretenimento e na educação.
Por Dalila Fonseca
Revisão Gabriele Sá
O professor e tradutor-intérprete de Língua Brasileira de Sinais, Ednilson Macêdo da Silva — Foto: Acervo pessoal.
Mais de 10 milhões de brasileiros possuem algum grau de surdez, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) estima que 2,7 milhões não escutam nada. Portanto, o Dia Nacional da Língua Brasileira de Sinais, comemorado em 24 de abril, é muito importante para promover uma sociedade mais inclusiva e igualitária.
A data escolhida foi em homenagem à Lei nº 10.436 de 2002, que reconheceu a língua como meio legal de comunicação e expressão. Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), somente 35,8% dos cidadãos com deficiência auditiva severa utilizam a Libras. Isso se deve à pluralidade linguística da comunidade surda, somada às barreiras para aprender a língua, pois, mesmo com a crescente demanda por acessibilidade, a quantidade de intérpretes formados ainda é insuficiente.
A regulamentação do Decreto 5.626 de 2005 determina a obrigatoriedade da Língua Brasileira de Sinais na grade curricular dos cursos de fonoaudiologia, pedagogia e capacitação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior. Legislações como essa visam criar oportunidades e assegurar a formação de um número maior de profissionais especializados, aptos tanto a ensinar quanto a acolher esses estudantes.
Apesar de um cenário desafiador revelado em 2019, quando só 7% dos estudantes com deficiência auditiva tinham concluído o ensino superior e 32% não tinham instrução formal. Dados recentes do Censo da Educação Básica 2023, coletados pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), indicam que há 4.842 estudantes com perda auditiva matriculados nas universidades e 1.397 já graduados – o que aponta avanços, ainda que lentos, na inclusão educacional desse grupo.
Intérpretes como agentes de mudança e do conhecimento
Márcio Henrique de Aguiar Coutinho, intérprete de Língua Brasileira de Sinais e professor bilíngue de matemática (Português e Libras). — Foto: Acervo pessoal.
Márcio H. Coutinho é um exemplo de como atitudes empáticas junto ao contato próximo com a comunidade surda podem gerar transformações significativas. O intérprete e educador bilíngue de Matemática, relata que a convivência com um colega surdo durante um curso de fotografia e o desejo de ajudá-lo o motivaram a aprender a Língua Brasileira de Sinais — interesse que já nutria quando jovem. Assim, encontrou seu propósito e paixão, especialmente em contextos religiosos e educacionais.
O entrevistado, que costuma fazer a tradução entre o português e a Libras, explica: “são duas línguas que possuem gramáticas e características diferentes, uma é oral-auditiva e a outra visual-espacial”. Logo, no seu ofício, as expressões faciais e corporais não podem ser ignoradas, pois a transposição também envolve adaptação, contexto e fluidez. Enquanto idiomas estrangeiros são amplamente valorizados, a Língua Brasileira de Sinais segue sendo menosprezada em seu próprio país, apesar de sua relevância para uma parcela da população, por isso, quem a domina fluentemente ganha vantagem no mercado de trabalho. Ademais, Coutinho evidencia que, apesar das necessidades e das possibilidades de atuação no setor, muitas organizações não garantem acesso equitativo a todos nem cumprem a legislação.
Acessibilidade e a ponte cultural da expressão
Ednilson Macêdo, conhecido como Edy, chamou a atenção do público no Festival Virada Salvador 2024, justamente pela sua interpretação tão expressiva. Suas habilidades permitem que surdos alfabetizados em Libras, ao participarem de shows ou festivais, não se sintam excluídos, tenham sua identidade respeitada e estabeleçam conexão com a cultura dos ouvintes. Recursos como janela de Libras, aplicativos, transcrição automática e legenda oculta tornam os conteúdos audiovisuais acessíveis. Mas é sobretudo através do comprometimento, da naturalidade e entrega artística dos intérpretes-tradutores em eventos culturais, que há uma repercussão positiva dentro ou fora da internet, e consequentemente aumenta a visibilidade desse sistema linguístico.
Embora a presença da Língua Nacional de Sinais seja obrigatória por lei em determinadas situações, como nas campanhas eleitorais, sua integração nos espaços midiáticos é mínima. Isso porque na realidade a língua é tratada como algo opcional, quando deveria ser considerada essencial. “Ainda estamos longe de ter todas as garantias constitucionais para as pessoas surdas” enfatiza Macêdo, que a 25 anos de carreira é a ponte entre ouvintes e não ouvintes, garantindo informações diversificadas e entretenimento. Para Edy o dia 24 de abril vai além da celebração: é uma data marcada pela conscientização, reflexão e luta por direitos.
Políticas públicas: A luta pelo reconhecimento e a visibilidade da Libras continua
Márcio Araújo, vice-presidente da ABATILS (Associação Baiana dos Profissionais Tradutores e Intérpretes da Língua de Sinais Brasileira). — Foto: Acervo pessoal.
ABATILS ou Associação Baiana dos Profissionais Tradutores, Intérpretes e Guias-Intérpretes da Língua de Sinais Brasileira, fundada em 2016 e sem fins lucrativos, busca defender os direitos desses trabalhadores qualificados. Realiza palestras, congressos, atividades sociais, divulga empregos, oferece cursos profissionalizantes, entre outros serviços. O vice-presidente dessa entidade civil, Márcio Araújo, afirma que ainda há resistência por parte de instituições privadas e públicas na contratação efetiva desses especialistas.
Ressalta algumas das políticas públicas em benefício de toda a classe. A primeira é a implementação dos cargos de professor, instrutor e TILSP (Tradutor Intérprete de Libras-Língua Portuguesa) nas leis orgânicas municipais e estaduais. A segunda é o estabelecimento de um piso salarial estadual para TILSP. “Uma terceira política pública seria o governo do estado e dos municípios criar escolas bilíngues, e de maior acesso à educação para pessoas surdas, ofertando vagas com acessibilidade”, acrescentou Araújo.
O vice-presidente da ABATILS destaca também o investimento em capacitação, exames de proficiência e fiscalização com o intuito de evitar que indivíduos sem qualificação adequada ocupem esses cargos. Desse modo, o Dia Nacional da Língua Brasileira de Sinais contribui tanto para a valorização desse tipo de comunicação quanto da profissão. É fundamental que todas as esferas da sociedade sejam inclusivas, para que os cidadãos com deficiência auditiva possam avançar cada vez mais na socialização e na aprendizagem.