Segundo a “The Ocean Cleanup” a aposta em novas tecnologias sustentáveis é a resposta para combater o problema global
De acordo com pesquisas realizadas pela organização internacional “The Ocean Cleanup”, mil rios são responsáveis por cerca de 80% da poluição mundial, e, atualmente, quatro deles se encontram na Região Metropolitana de Salvador: os rios Camarajipe, Lucaia e Jaguaribe, localizados na capital baiana, e o Rio Joanes, localizado na cidade de Lauro de Freitas.
Os demais 20% da poluição mundial estão distribuídos entre outros 30 mil rios ao redor do mundo. Devido à óbvia concentração de população, os rios localizados em áreas urbanas volumosas acabam sendo os mais poluentes.
Esses rios são os principais carregadores de resíduos plásticos até os oceanos. Por ano, o total de emissões globais de plásticos é estimado entre 0,8 e 2,7 milhões de toneladas métricas.
No Brasil, estes e diversos outros rios, são analisados anualmente pelo Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), que visa diagnosticar a qualidade ambiental dos corpos de água da região.
A mais recente análise, realizada por Ailton dos Santos Júnior, coordenador geral, e sua equipe de biólogos, teve seu relatório divulgado no ano de 2020. A coleta concluiu que, referente aos resultados do Índice de Qualidade das Águas (IQA), 86% dos pontos de amostragem foram classificados como “RUIM” ou “PÉSSIMO”, revelando uma piora com relação a campanha do ano passado, quando este valor foi de 72%.
Apenas um ponto foi classificado como “BOM” na classificação IQA, o rio Passa Vaca, na capital baiana, que demonstrou uma melhora na qualidade da água quando comparado aos resultados do ano de 2019.
Já os resultados do cálculo do Índice do Estado Trófico (IET) mostraram que 88% de todos os rios estudados apresentaram um alto grau de eutrofização, processo de poluição que deixam rios e lagos com uma coloração turva, com níveis baixíssimos de oxigênio na água.
Os resultados indicam, portanto, alto índice de degradação dos rios urbanos dos municípios de Salvador e Feira de Santana.
Atualmente, de acordo com o Inema, a cidade de Salvador também possui três lagos por toda a extensão do seu município. São eles: o Dique do Tororó, situado no Bairro de Nazaré; Lagoa do Abaeté, em Itapuã e Lagoa de Pituaçu, no Parque Metropolitano de Pituaçu.
O último relatório, que analisou os lagos da cidade, foi realizado no ano de 2019. A análise do Índice de Qualidade da Água (IQA) demonstrou bons resultados, na qual foi possível observar que todas as lagoas apresentaram qualidade da água classificada como “BOM”.
No entanto, cabe reforçar que nenhum desses lagos é potável, ou seja, a sua água não deve ser consumida.
A responsabilidade pela limpeza desses rios e lagos soteropolitanos fica a cargo da Secretária de Manutenção da Cidade (Seman), que tem a responsabilidade de drenar e limpar esses corpos de água.
Segundo o próprio site da instituição, “a limpeza e dragagem dos canais, córregos e rios, é uma atividade rotineira da SEMAN”, e tem o objetivo de “manter ou restabelecer as mínimas condições hidráulicas de funcionamento do sistema de macrodrenagem da cidade.”
A Seman também informa que o trabalho é feito para evitar e/ou minimizar possíveis danos à população nos períodos de chuvas intensas, e é feito com o auxílio de diversas ferramentas.
“Os serviços de dragagem, em sua quase totalidade, são realizados por equipamentos de grande porte, dentre eles: escavadeiras hidráulicas de braço curto e longo, retro escavadeiras, pás carregadeiras e caçambas. Em situações especiais ou pela inexistência de acesso aos equipamentos, são realizadas operações de limpeza manuais.”
Também abordamos a Seman sobre os dados divulgados pela pesquisa da The Ocean Cleanup, no entanto, as perguntas referentes ao assunto não foram respondidas.
Interceptor
Para capturar o lixo antes que ele chegue aos oceanos, a grande proposta sugerida pela The Ocean Cleanup é a aposta nos Interceptors. Financiadas pela própria organização, essas máquinas autônomas são movidas 100% a energia solar, e são capazes de operar na maioria dos rios mais poluentes do mundo.
De acordo com o site oficial, barreiras são implementadas nos rios, que, com ajuda da corrente da água, guiam o lixo para a abertura do Interceptor. Dentro da máquina, uma correia transportadora deposita os detritos em uma espécie de esteira automática, que utiliza dados de um sensor para preencher igualmente seis recipientes até atingirem a capacidade máxima.
O Interceptor pode armazenar até 50m³ de lixo antes de precisar ser esvaziado, e quando seus reservatórios estão quase cheios, ele envia automaticamente uma mensagem de texto para os operadores locais virem coletar os resíduos.
Viviane Consolação, engenheira mecatrônica da Petrobras, afirma que, do ponto de vista tecnológico, o maior desafio para a limpeza dos rios baianos é, justamente, a falta investimento em tecnologias mais eficientes.
“Essa máquina é capaz de trabalhar nas áreas mais complexas, dentro do leito dos rios, recolhendo uma grande parte do lixo antes que ele chegue ao oceano. Também por se tratar de ser controlada remotamente, ela severamente reduz os custos operacionais, por não necessitar de uma tripulação”, explica a engenheira.
“Além disso, por ser completamente alimentada por meios sustentáveis de geração de energia, isso diminui ainda mais o impacto gerado ao planeta”, completa Consolação.
A engenheira também acredita que é viável investir em projetos similares aqui na Bahia, já que “a limpeza dos nossos rios é imprescindível, não só para a preservação da vida marinha e do nosso patrimônio ecológico, mas também para proteger vários setores econômicos baianos, como o pesqueiro e o turístico.”
Praias e mares baianos
Devido ao alto nível de poluição dos rios, a quantidade de lixo que chega nos mares baianos é exorbitante. A falta de uma educação ecológica vinda da população também afeta as praias, que muitas vezes também sofrem com a poluição extrema devido a serem pontos turísticos.
Por isso, órgãos que visam lutar para combater o problema muitas vezes sofrem com uma grande demanda de trabalho, sejam eles governamentais ou sem fins lucrativos.
Por exemplo, na Bahia, mais precisamente em Mata de São João, onde é localizada a sua sede, existe o Projeto TAMAR, que é um projeto conservacionista brasileiro que atua na preservação das tartarugas-marinhas ameaçadas de extinção.
Presente em 23 localidades, distribuídas em oito estados brasileiros, suas atividades são organizadas a partir de três linhas de ação: conservação e pesquisa aplicadas, educação ambiental e o desenvolvimento local sustentável.
O Projeto é responsável por diversas iniciativas de conservação e desenvolvimento comunitário, essas atividades envolvem atualmente cerca de mil e duzentas pessoas, a maioria moradores das comunidades, essenciais para a proteção das tartarugas marinhas e preservação do ambiente marinho diminuindo a pressão humana sobre os ecossistemas e as espécies.
Em agosto deste ano, o projeto, juntamente com a Secretaria Municipal de Serviços Públicos (SESP), foi responsável pelo mapeamento de pontos críticos do litoral de Lauro de Freitas, que afetam a vida das tartarugas, e criou ações de conscientização ações educativas com moradores e barraqueiros para a conservação do ambiente marinho.
Segundo o TAMAR, redes de pesca, anzóis, desenvolvimento costeiro, degradação de áreas de desova, fotopoluição e, principalmente, a poluição dos oceanos e as mudanças climáticas são as principais ameaças à vida marinha brasileira, principalmente as tartarugas, e podem interromper o início da recuperação das populações de cinco espécies que existem no Brasil.
“Sensibilizar as comunidades litorâneas e a sociedade para que se tornem aliadas na conservação das tartarugas marinhas e seus habitats tem sido uma ação contínua da Fundação Projeto Tamar. Diferentes estratégias, instrumentos e ações considerando as especificidades de cada localidade e os principais desafios e ameaças à sobrevivência das espécies são executadas nos Centros de Visitantes e nas comunidades litorâneas das áreas de atuação”, informa o projeto.
Atualmente, também combatendo a poluição nas praias, a Empresa de Limpeza Urbana de Salvador (Limpurb), que é responsável pela coleta e descarte de todo o lixo que é produzido na cidade, incluindo toda a orla da capital, efetua manualmente a limpeza nas faixas de areia com uso de ancinhos, forcados de 10 dentes, vassouras metálicas e contêineres, além dos carros de mão para transporte da produção.
Nos trechos de praia, em que a faixa de areia é larga, é utilizado equipamentos mecânicos que revolvem a areia a uma profundidade de 20cm, conduzindo a areia a uma peneira vibratória retendo os detritos e devolvendo a areia à praia. Na remoção da produção pode-se utilizar mini trator agrícola com carreta.
O plano de execução é elaborado em função da quilometragem e extensão da faixa de areia utilizada pelo banhista, além do conhecimento e das características específicas de cada trecho.
A atividade é realizada com frequência diária, no período diurno, sendo intensificada aos sábados e dias de feriados. No período de verão, o serviço também é realizado à noite, devido ao acentuado aumento dos banhistas, turistas e atletas.
Foi com esse empenho que a Limpurb conseguiu efetuar, juntamente com outros órgãos, a limpeza das praias de Salvador após o derramamento de óleo ocorrido no final de agosto até 23 de outubro do ano de 2019.
Na época, o vazamento espalhou petróleo cru pelo mar, atingindo mais de dois mil quilômetros do litoral das regiões Nordeste e Sudeste do Brasil.
Essa força-tarefa, que foi criada pela Prefeitura, através da Limpurb, para remover as manchas de petróleo nas praias de Salvador, esteve focada na retirada dos fragmentos que ficaram sob as pedras e na areia, com uso de máquina com peneiras puxadas por um trator.
O equipamento tinha a função de separar os pequenos resíduos e devolver a areia limpa ao lugar de origem. Um jato de pressão também misturava água e areia para a remoção do petróleo nas pedras e peneiras, que foram retirados manualmente pelos agentes para a retirada de partículas em locais onde os veículos não têm acesso.
Alcance global
A poluição é um problema mundial, por isso, esforços internacionais também estão sendo efetuados para diminuir o efeito da contaminação e combater a propagação do lixo.
Um desses exemplos é a campanha global #TeamSeas, que foi oficialmente lançada dia 29 de outubro de 2021, e planeja arrecadar US$30 milhões para remover cerca de 14 milhões de quilos de lixo de oceanos, praias e rios ao redor do mundo.
I Cleaned The World’s Dirtiest Beach #TeamSeas
As doações, que podem ser feitas através do site oficial, serão entregues diretamente para duas organizações sem fins lucrativos: a Ocean Conservancy e a própria The Ocean Cleanup, financiadora do Interceptor
Os fundos irão ser divididos igualmente entre as instituições, e o dinheiro só será liberado quando o lixo for removido e sua mobilização verificada.
Graças a uma enorme onda de vídeos promovendo a hashtag, até a postagem dessa matéria, o #TeamSeas já acumulou mais de US$17 milhões, planejando ainda alcançar a sua meta total até 1º de janeiro de 2022, data de finalização do projeto.
A iniciativa funciona como a segunda parte da maior campanha de arrecadação de fundos online liderada por criadores de conteúdo da internet. A primeira parte foi concluída com o sucesso do projeto #TeamTrees, que, em dezembro de 2019, atingiu o objetivo de arrecadar US$20 milhões.
Os fundos estão, atualmente, sendo utilizados para plantar 20 milhões de árvores em 28 países diferentes, incluindo o Brasil.
Assim como o #TeamTrees, o #TeamSeas é liderado pelo diretor de campanhas Matt Fitzgerald e pelos youtubers Mark Rober e MrBeast, que, combinados, possuem mais de 90 milhões de inscritos na plataforma.
Para Sérgio Vinícius, um ávido doador que regularmente apoia campanhas que trabalham em prol ao meio ambiente, o que o fez contribuir para o #TeamSeas foi justamente o seu alcance global.
“Acho importante apoiar iniciativas que, além de conscientizar a população, também buscam limpar o nosso planeta através de ações concretas e de grande escala, diminuindo, assim, o impacto negativo que temos no meio ambiente”, declara Vinícius.
Na sua opinião, o #TeamSeas tem um alcance muito maior do que qualquer projeto existente na Bahia. Para ele, isso é algo negativo, já que a pesquisa realizada pela The Ocean Cleanup mostrou que mais de 1.5 milhões de quilos de lixo são produzidos somente na região metropolitana do estado.
“Projetos como o TAMAR e o Baleia Jubarte fazem trabalhos incríveis, mas, infelizmente, suas coberturas só se estendem a apenas alguns estados do país e, muitas vezes, o dinheiro para realizar ações mais complicadas simplesmente não está lá, seja por falta de ajuda governamental ou uma educação ecológica populacional de qualidade”, declara.
Sérgio afirma que a maneira como a iniciativa do #TeamSeas foi pensada, com o auxílio de uma campanha online, trouxe um apoio em escala global, e acredita que “isso irá fazer um impacto positivo enorme no nosso planeta, além de chamar mais pessoas para a causa.”
Repórteres: Manuela Lopo e Victoria Souza
Revisão: Antônio Netto