Com a continuidade da pandemia, poder público e entidades do trade turístico e de eventos seguem apreensivos sobre a realização da festividade no próximo ano
A não realização do Carnaval de Salvador, em 2021, por conta da pandemia, gerou grandes prejuízos financeiros para a capital baiana e todos que dependem do evento como fonte de receita. A apreensão continua com a possibilidade da não acontecer a festividade em 2022.
Pesquisa feita pela Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia estimou que a falta dessa festividade deixou de movimentar pelo menos R$1,7 bilhão na capital baiana, sendo esse estudo referente apenas aos gastos de visitantes.
Em 2020, os hotéis de Salvador tiveram uma redução de quase 55% do faturamento em relação aos anos não pandêmicos, o equivalente a uma perda de cerca de R$ 673 milhões.
Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis da Bahia (ABIH-BA), Luciano Lopes, “houve o pior desempenho da história da hotelaria soteropolitana”.
Com a possibilidade da não do realização do evento também em 2022, “os hotéis realmente atravessam uma situação muito difícil”, afirma o presidente da ABIH-Bahia. “Então esperamos que tenhamos sim um Carnaval em 2022 de alguma forma, para que isso possa melhorar o nosso faturamento e o nosso negócio”, completa.
Lopes conta ainda que a taxa de desemprego na rede foi muito grande durante a pandemia, pois os negócios ficaram paralisados. Apesar disso, mais de 80% dos empregos no setor já foram recuperados.
Para o presidente da ABIH-Bahia, existe a expectativa de que no final de 2022 exista uma plena recuperação dos empregos que foram perdidos: “essa é nossa expectativa, claro, desde que a gente não tenha um aumento no número de casos de Covid-19”.
Outros setores econômicos
A falta do evento impacta toda uma cadeia de profissionais que dependem do Carnaval, como donos de pequenos restaurantes, vendedores ambulantes de bebidas, que durante a festa conseguem garantir uma importante renda extra para suas famílias.
Jaciara da Silva é vendedora ambulante e conta que costuma trabalhar no circuito em época de Carnaval. Entretanto, com a pandemia, que impediu a realização do evento, Jaciara relata que passou por grandes dificuldades financeiras.
“Tive que vender bala no ônibus para tentar me sustentar”, afirma a vendedora. Ainda assim, sobre a volta do Carnaval em 2022, Jaciara diz que por um lado seria bom por poder trabalhar como antes, mas que prefere prezar pela sua saúde e dos seus filhos para não os contaminar com o vírus.
Outro vendedor ambulante, Ronaldo Farias, relata: “não costumo trabalhar no circuito em época de Carnaval, mas o lado bom da volta do evento no próximo ano é poder gerar emprego para as pessoas que precisam, porém, um lado negativo é do vírus acabar se espalhando ainda mais”.
O vereador soteropolitano, Augusto Vasconcelos, do PCdoB, e presidente do Sindicato dos Bancários da Bahia, conta que com a pandemia os setores de cultura, de eventos e entretenimento, do turismo e da rede de hotelaria, certamente foram os mais atingidos.
“A pandemia atingiu em cheio e dificultou bastante a situação econômica dessas empresas, levando a demissões em massa de milhões de pessoas”, afirma o vereador.
Há diversas pesquisas que apontam o tamanho do prejuízo, mas “o fato inegável é que a perda lucrativa, devido a falta do evento, foi bilionária, inclusive para a economia brasileira”, aponta Vasconcelos.
Carnaval 2022?
As expectativas da não realização da festividade em 2022 continuam assombrando o mercado e todos que dependem deste evento.
Com a pandemia ainda em curso e as crescentes ondas da doença no continente Europeu e nos Estados Unidos, dúvidas estão surgiram sobre a possibilidade de haver Carnaval em Salvador no próximo ano.
Recentemente, o Governador da Bahia, Rui Costa, afirmou que não colocará a população em risco com casos ainda ativos circulando pelo mundo.
“O coronavírus mostrou que precisamos ter mais humildade e acreditar na ciência. Não colocarei a população em risco com definições sobre o carnaval enquanto temos 2,5 mil casos ativos e o vírus voltando com força em diversos países. O Carnaval não pode estar acima da vida das pessoas”, declarou o Governador em postagem em sua rede social.
Vereador Vasconcelos explica que o Carnaval é um grande evento que merece o reconhecimento da população e a luta pela sua efetivação e implementação, “no entanto não vale a pena arriscar a vida das pessoas em detrimento de uma atividade”.
Especialistas sanitários afirmam que ainda não é o momento de realizar uma festa desse porte, sendo recomendado somente com o avanço da vacinação e melhoria em nível global.
“Salvador não gera uma arrecadação tributária que arque com as despesas da festa. Inclusive economiza não tendo o Carnaval, porém ele é fundamental para diversas pessoas ambulantes, catadores de materiais recicláveis, cordeiros entre outros segmentos que têm uma renda neste período”, afirma o vereador.
Vasconcelos defende que haja uma política pública de acolhimento, em especial da parcela mais pobre da população, que está perdendo essa oportunidade de rendimento.
“Por isso, eu tenho muita cautela em relação ao Carnaval, acho inclusive que podemos pensar em uma mudança de datas, exatamente para ampliar o número de pessoas vacinadas, não só em Salvador, mas no Brasil inteiro, lembrando que o Carnaval atrai muitos turistas”, diz o vereador.
Em entrevista, o vereador George Pereira, conhecido como “Gordinho da Favela”, do PSL, elogiou a decisão do prefeito Bruno Reis (DEM) de não realizar a tradicional festa da virada do ano em Salvador.
“Para a cidade, até mesmo para os meus eleitores, que é um pessoal da comunidade, pessoas que realmente precisam do Carnaval, que vivem do Carnaval, seria bom de fato ter a festa, um grande aumento nos ganhos”, explica Pereira. “Mas tem que ser com uma autorização dada pelo Governador do Estado e pelo prefeito, com muita cautela”, completa.
“A conta pode ser boa agora, mas e depois? Quem paga a conta? Temos que ser muito cuidadosos no momento. Eu sei que o setor de entretenimento vem sofrendo muito, os empresários também, mas eu tenho certeza que precisamos ser cautelosos, porque já foram 600 mil mortes pela covid-19 e quem sabe se uma atitude irresponsável agora pode fazer os outros pagarem por isso depois”, alerta o vereador.
Opiniões divididas
Em relação ao comparecimento ao evento a população está bem dividida, o aposentado, Fernando Ferreira dos Reis, de 52 anos, afirma que não se sentirá seguro no Carnaval 2022 e que por isso não se fará presente: “Mesmo com a vacina, tem muita gente que não está imunizada, tem que ter tomado a terceira dose”.
Já a empregada doméstica, Maria do Carmo Alcantara Santos, de 58 anos, diz que se a festa acontecer estará lá e justifica a realização do evento pesando os prós e contras:
“Nem todo mundo está vacinado e pode aumentar o vírus e vir mais mortes. Por outros pontos, sim, porque iria gerar emprego, tem muita gente desempregada por conta dessa crise, mas aí só as autoridades para dizer. Por mim tinha, porque mesmo sendo baiana nunca participei, então eu iria estar lá me divertindo no carnaval em Salvador”.
Repórteres: Heide Anne Ferreira Lopes Reis, Luiz Alberto Gonçalves Almeida, Maria Gabriella Santos Nascimento, Mariana de Oliveira Nogueira, Victor Guilherme Souza Lopes
Revisão: Antônio Netto