Teatro Vazio / Foto: Freepik
Artistas e produtores resistem e reinventam as suas obras. Apesar das dificuldades, mantêm o compromisso com a arte
Por Kauan Brandão
Revisão Gabriele Sá
O cenário atual do teatro na cidade preocupa quem trabalha com a realização de espetáculos. Com a desvalorização de muitos espaços, artistas com baixa remuneração, manutenções longas com datas de entrega distantes, quem trabalha na área se preocupa e quem pensa em começar cogita desistir. Muitos pontos interligados que compõem o cenário atual do teatro reforçam estatísticas de descontinuidades de espaços culturais na cidade.
Welber Barreto é ator da companhia “Palco Encantado”, conversou com a Avera e falou sobre a sua paixão pelo teatro. Além de produzir, gosta de acompanhar atividades culturais na cidade, destaca que a arte transforma vidas e que faz parte do cotidiano de forma natural.
O teatro é uma ferramenta poderosa de narrativa que constrói uma ideia, história e tem a capacidade de educar. Permite a visão sobre o ponto de vista de quem está produzindo, e quem consome tem a sua visão sobre o mundo ampliada. Podendo conhecer realidades diferentes, questões sociais ou humor, ampliando assim, o seu repertório cultural. As casas de espetáculos de Salvador carecem de apoio, estrutura e, um dos mais importantes, o público, que consome cada vez menos uma peça de teatro, será que essa é uma característica da nova geração ou existe algo que desestimula os espectadores?

Cena de Peça Teatral da Companhia de Teatro BIML / Foto: Acervo Pessoal
Teatro Gamboa
Um espaço que luta para continuar ativo e manter firme o seu compromisso de permitir a exibição de diferentes expressões artísticas e dar oportunidade a artistas que estão iniciando no mercado. O Teatro Gamboa, localizado no centro da cidade, tem 51 anos de história e será colocado à venda. A associação do espaço vem a partir de uma campanha para angariar fundos e comprar o teatro.
O produtor do espaço, Ícaro Piton, conta que existe uma campanha de financiamento coletivo do espaço, intitulada de “Fica, Gamboa”. A partir dessa campanha, a associação do teatro tem o objetivo de conseguir fundos para comprar o imóvel e garantir que ele continue em funcionamento. A prioridade da compra foi dada ao Teatro Gamboa e a meta da campanha é de arrecadar R$500.000,00.

Teatro Gamboa / Foto: Kauan Brandão
O espaço está inserido na nascente cultural de Salvador, democratiza a arte para quem produz e para quem assiste ao espetáculo. Dispondo de 60 lugares, o contato com o artista termina se tornando mais próximo, propiciando um ambiente acolhedor, intimista e acessível.
O teatro usa esse espaço ao seu favor, onde faz ao final de cada espetáculo o “Papo Gamboa”, onde ocorre uma conversa do público com o artista. Quem se apresenta neste palco recebe toda a bilheteria do espetáculo, diferente de outros espaços em que a casa fica com uma porcentagem do lucro.
Desafios de gerenciar uma companhia de teatro
Em conversa com a Avera, Fábio Santana é ator e gestor da Companhia de Teatro Suburbano. Para ele, o cenário do teatro na cidade é diverso e plural, e se algum for contemplado com políticas públicas e apoio via edital, é importante para ter cada vez mais. A cidade ainda carece de grupos e espaços teatrais.
No passado o cenário teatral não era desvalorizado, a Bahia sempre foi pioneira e referência em teatro. Temos o exemplo da escola de teatro da UFBA (Universidade Federal da Bahia), sendo a primeira da América Latina a ofertar o ensino superior em artes cênicas, fundada em 1956.
Ele acredita que hoje o maior desafio na gestão de uma companhia é mantê-la estável. Tendo um corpo artístico presente e sem muitas alterações, com integrantes que acreditem na arte como um poder de transformação da nossa sociedade. Ressalta também que a companhia é importante para o Subúrbio Ferroviário, da mesma forma que outras cias são importantes por retratar situações do cotidiano, integrar e socializar com a comunidade.

Cia de Teatro Suburbando / Foto: Divulgação
O ator também faz parte do Bando de Teatro Olodum e tem mais de trinta anos de carreira. Revela que sobreviver apenas da arte é algo difícil até mesmo para quem tem bastante tempo de carreira, isso para atores e atrizes iniciantes pode ser desencorajador. Os maiores desafios são permitir que a equipe continue acreditando na arte como transformação de vida e acessar recursos públicos para ajudar a manter os artistas e a produção.
Público desmotivado
A ida ao teatro na infância é pouco explorada, são priorizadas atividades do cotidiano e outras programações convencionais, como ida a parques, shoppings, cinemas e outros ambientes. Os estímulos do teatro na infância são importantes porque estimulam a formação de jovens atores e do público que irá se beneficiar no futuro.
Desde cedo as pessoas não são incentivadas a ter contato com o teatro, além disso, existe a escassez de muitas produções teatrais, e quando tem, não são divulgadas da forma adequada. Isso contribui para que o público não desenvolva o hábito e o interesse em frequentar peças teatrais, afirma Ayala Costa, que tem 21 anos e estuda odontologia.
Ela ainda reforça que, como jovem, tem a visão de que esse é um público que está indo cada vez menos ao teatro. Acha importante iniciativas culturais e projetos que buscam aproximar pessoas do teatro, onde facilita o acesso e faz com que esta seja uma forma de entretenimento cada vez mais escolhida pelo público.
Longas reformas das casas de espetáculos
O Teatro Castro Alves (TCA) está há mais de dois anos sem a sua sala principal, que foi atingida por um incêndio em 2023. Tem previsão de reabertura para 2026, segundo o Secretário de Cultura da Bahia, Bruno Monteiro. Um espaço renomado como o TCA está neste extenso processo de manutenção, enquanto outras casas de espetáculo independentes que carecem de recursos emitidos por instituições públicas, privadas ou terceiro setor, continuam ativas para o entretenimento do público.
O Teatro Vila Velha segue no mesmo caminho, o primeiro teatro independente da Bahia, com 60 anos de história. Um espaço que já recebeu artistas como Gilberto Gil, Caetano Veloso e muitos outros, atualmente está em uma reforma que começou em 2024. As redes sociais do espaço continuam ativas, e informam que a requalificação do teatro o tornará mais acessível e moderno, adaptando as normas de acessibilidade e segurança. O espaço está sendo requalificado com o apoio da prefeitura, das ações continuadas do fundo de cultura, Secretaria da Fazenda e da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia.
Futuro da cultura
Com a chegada de streamings e cada vez mais pessoas produzindo conteúdo para redes sociais, formas convencionais de consumir arte acabam ficando sem destaque. Artistas precisam se reinventar para continuar ocupando espaços com diferentes formas de fazer arte. E por falar em arte, como é possível imaginar o futuro do cenário cultural?
No lançamento do seu novo livro “Descobrindo A Minha História”, o ator Lázaro Ramos celebra estar mais uma vez em Salvador, e escolheu o MUNCAB (Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira) para este evento. Questionado sobre o futuro da cultura, Lázaro reforça que espera a existência da integração dos saberes que já passaram, dos que estão fazendo o agora e os que farão o amanhã.
A nova geração que se aproxima será responsável por movimentar a cultura, por isso é importante o estímulo e incentivo da arte a todos os públicos, especialmente as crianças e adolescentes que estão construindo idéias, repertórios e explorando cada vez mais o mundo com diferentes formas de expressões artísticas.
“A cultura tem sido um lugar de permanência dessa conexão, cada geração que chega contribui com a sua voz e os seus pensamentos, renovando ou resgatando. Mas essa conexão é o que eu espero do futuro da cultura.”, afirma Lázaro Ramos.
