Foto: Assessoria da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (SESAB)
A saúde integral da população trans e travesti continua sendo uma construção coletiva entre Estado, profissionais de saúde e movimentos sociais
Por Lucas Alencar
Revisão Júlia Ma
A Bahia tem avançado na oferta de serviços de saúde voltados à população trans e travesti. Segundo a Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (SESAB), o estado conta hoje com 11 ambulatórios especializados, sendo quatro em Salvador e sete no interior, em cidades como Juazeiro, Ilhéus, Camaçari e Santo Antônio de Jesus. Esses espaços oferecem acompanhamento psicológico, endocrinológico e ginecológico, além de serviços de hormonização e encaminhamentos para o processo transexualizador.
Apesar dos avanços, ainda há desafios. Lian Batista, homem trans e operador de produção, relata que percebe melhorias, mas afirma que o atendimento ainda não alcançou o ideal: “As coisas melhoraram, mas ainda não estão em um ponto onde a gente pense: ‘agora sim, valeu a pena’”.
A transexualizarão é realizada no Hospital das Clínicas (HUPES/UFBA) desde 2023. O hospital foi habilitado para receber financiamento federal para essa finalidade em 2025. O estado da Bahia também conta com o Ambulatório Trans do Centro Estadual Especializado em Diagnóstico, Assistência e Pesquisa (CEDAP), em Salvador, referência no acolhimento de pessoas trans e travestis, incluindo crianças e adolescentes.
O serviço do CEDAP oferece atendimento por encaminhamento ou demanda espontânea, com acesso a exames, medicação hormonal e acompanhamento psicossocial. Segundo a SESAB, objetiva-se, dessa forma, “garantir um cuidado integral e humanizado, com representatividade trans também na equipe de profissionais”.
Outros exemplos de avanços são o programa Transgesta, que permite o pré natal e o acompanhamento da gestação de homens trans e pessoas não-binárias. Em Salvador, a referência é a Maternidade Climério de Oliveira, da UFBA. A maternidade recebe também os indivíduos encaminhados de outras regiões do estado, através de interconsultas, garantindo maior cobertura.
“Às vezes passamos o dia inteiro esperando um atendimento ou uma aplicação. Os recursos são escassos, mas é visível o esforço dos profissionais. Isso dá esperança de que as coisas melhorem mais e mais”, afirma Lian em relação aos obstáculos ao SUS no acesso à hormonização.

Lian Batista — Foto: Acervo pessoal
Ele explica que a dispensação de hormônios acontece, mas nem sempre de maneira regular, já que a falta de fornecimento por parte do Ministério da Saúde compromete a continuidade do tratamento. Entre as principais barreiras, Lian cita a dificuldade de acessar ginecologistas, psicólogos e o procedimento de mastectomia. Para ele, a mudança mais urgente passa pela educação dos profissionais de saúde.
“Quando algo que já é difícil de acessar se soma ao desprezo ou ao tratamento desrespeitoso, o impacto emocional é enorme”, afirma. Mesmo assim, conta que situações de desrespeito e despreparo ainda são comuns. “É constrangedor e chato, mas a gente acaba aprendendo a se impor, com paciência, consciência dos direitos e de cabeça erguida”, diz.
Além dos serviços públicos, os movimentos sociais desempenham papel essencial na luta por melhorias. Coletivos e associações trans têm atuado no Conselho Estadual de Saúde e no Comitê Estadual de Saúde LGBTQIAPN+, pressionando por avanços e fiscalização das políticas públicas. A SESAB reconhece que ainda há distância entre o que está previsto na Política Nacional de Saúde Integral LGBTQIAPN+ e o que é efetivamente oferecido nos serviços.
A falta de preparo dos profissionais continua sendo um dos pontos mais críticos, impactando até mesmo no uso correto do nome social, influenciando diretamente na busca por cuidados básicos e preventivos. A ausência de dados sobre identidade de gênero nos sistemas oficiais também dificulta o planejamento de políticas efetivas.
